quarta-feira, março 02, 2005

Vidro


Estava estilhaçada em fragmentos
Estava nas paredes sujas dos prédios na cidade
Nas valetas com papeis desfeitos e latas de coca-cola
Nos carros e no fumo negro dos canos de escape
Nas televisões em volume máximo
Nas pessoas a correr aos tropeções
Nos cães com sarna e nas crianças desabrigadas
Estava estilhaçada na dor e no ruído

Um dia uma mão dourada pegou no vidro translúcido
Que brilhava na calçada e guardou-o no coração
Então encontrei-me no silêncio e fiquei só uma



De Maat7:

apenas uma estrela
fazia um pequeno desenho no chão
um brilho de primeiro dia
de fuga e desafio

jamais a encontrariam na abóbada celeste
entre os nomes e as pedras limpas
da alegria

secreta quase invisível
era um nome à luz do trigo
para ser dia
ou cítara do vento para adormecer os deuses
e habitar o silêncio despojado e nu
no brilho dos navios

só o meu destino passaria neste bosque
exacto como um rio




Foto de João Coutinho