Aninhei-me quieta no teu colo à espera do momento em que descobrisses. Agora sabes bem que nunca estive lá. Nunca estive em lugar nenhum a não ser neste caminho luminoso que só encontro no silêncio. Uma flecha atirada sem rumo, sem arco, sem mão. Nunca fui de nada. Esta despertença deu-me o dom de partir a toda a hora, de ir embora antes de verem mais do que este ‘nenhum cabelo fora do lugar’. O grande drama é viver sem epiderme. Sem camada superficial que proteja do vento gelado. Tudo dói tanto. Tudo dói.
Há algo que se perdeu. Insinua-se ás vezes num pensamento, mas escapa sempre sem se desvendar. O que se perdeu? O que se terá perdido que me deixa tão tranquila?
Dezembro de 2008
Foto de João Coutinho