segunda-feira, outubro 29, 2012

Arte poética

 

Há um motivo de seda nas cordas 
do coração. Puxo-o devagar, com os dedos 
da alma, e o que aparece na mão 
são coisas simples, confissões, segredos. 

Mas se visto com essa seda a tua 
imagem, o que os meus dedos tocam 
é mais real do que a vida, e tem 
o teu corpo, os teus lábios, a tua voz. 

Desfaço assim, o embrulho da estrofe, 
e deito fora os cordéis da retórica, 
 o papel das figuras, a cola da música. 

É melhor assim, quando o poema fica 
às escuras no silêncio da casa, e me 
deixa ouvir os teus passos, tão junto a mim.  

Nuno Júdice in O breve sentimento do eterno 

Foto de Luís Miguel Duarte

segunda-feira, outubro 22, 2012

quarta-feira, outubro 03, 2012

Orfãos



Houve uma noite em que pensei 
Que ia morrer 
Não sei bem se foi pensamento ou
Um quase sonho 
Naqueles minutos que antecedem 
o esquecimento 

Eu não sei onde estão as mãos 
Que me deviam embalar 
Limpar o suor da testa 
Onde estão os lábios 
Que me deviam cantar 
Dar beijos no cabelo 

Sei apenas que no corredor do medo 
Não há ninguém 
Que abra a porta e diga: 
Vem por aqui 
É este o caminho para tua casa. 


Foto de Luís Miguel Duarte