quinta-feira, dezembro 29, 2005

Votos




Quando era pequena não gostava de peixe, de sopa, de arroz de feijão, arroz de polvo, arroz de tomate... Com o tempo aprendi a gostar.

Quando fazia votos, não entendia porque é que a saúde vinha em primeiro lugar - embora achasse sensato que assim fosse.

Pois bem, venho hoje com toda a minha força fazer os meus votos para 2006.

Peço que ninguém dos que me são queridos seja inserido novamente nas estatísticas da incidência do cancro de estomâgo nos países do sul. Peço também que eu própria não volte a engrossar a lista de vítimas de atropelamento.

Peço que o espaço de amor incondicional que são os meus dias me proteja sempre de tudo o que me ultrapassa.

Subitamente aprendi na pele o que remotamente me parecia sensato: nos votos de ano novo o que se pede com mais força é saúde e de seguida amor, porque o dinheiro de nada vale quando nos confrontamos com a nossa imensa fragilidade.

Quero também agradecer o amor anónimo e inconsciente que muitas vezes me deram este ano, sem saberem sequer o que se passava do lado de cá.

Bom 2006 para todos com esta ordem de prioridades. Infinitamente obrigada.



Foto de João Coutinho

sexta-feira, dezembro 23, 2005

Natal



A poesia é a minha salvação. Afasta-me das coisas que me rodeiam, para me aproximar delas mais profundamente.

Tonino Guerra em entrevista a Carlos Vaz Marques, ontem na TSF em Pessoal e Transmissível


Também sobre o Natal, sinto a necessidade de me afastar do que me rodeia estes dias, para me aproximar do tempo em que na lareira da cozinha brilhava uma grande fogueira, cheirava a canela no ar e ouvia-se cantar as janeiras na torre da igreja. Não havia presentes, mas estávamos todos.


Desejo a vocês este Natal, sentido profundamente.


Foto de João Coutinho.

domingo, dezembro 18, 2005

Uma carta



Queria que soubesses que morei em tua casa. Andei contigo na escola primária e saí muitas vezes com os teus sapatos. Sei bem dos passos inseguros. Sei do espanto e do mundo silencioso no canto da sala. Lembro-me do fascínio pelas casas grandes e pelos segredos escondidos dentro dos armários.

Colei muitas vezes o nariz ao vidro da tua janela e pensei que também gostaria de brincar na rua. Mas tudo era demasiado longe por detrás daquela porta.

Se hoje existe um lugar onde nenhuma linguagem se fala e se nesse lugar nos encontramos inevitavelmente é porque percorremos longas distâncias lado a lado. Não diria mão na mão, porque a mão era só uma.



Foto de João Coutinho

quinta-feira, dezembro 08, 2005

Solitas, solitatis


A Saudade é um sentimento universal; mas, só na alma lusitana, atinge as alturas supremas da Poesia -, contendo uma concepção da vida e da existência.

Pascoaes, T. (1986). Da saudade. Em A. Botelho & A.B. Teixeira (Orgs.). Filosofia da Saudade (p.124-144). Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda. (Original publicado em 1952).


Habitados a tal ponto pela saudade, os portugueses renunciaram a defini-la. Da saudade fizeram uma espécie de enigma, essência do seu sentimento da existência, a ponto de a transformarem num ‘mito’. É essa mitificação de um sentimento universal que dá à estranha melancolia sem tragédia que é o seu verdadeiro conteúdo cultural, e faz dela o brasão da sensibilidade portuguesa.

Lourenço, E. (1999). Mitologia da Saudade: seguido de Portugal como destino. São Paulo: Companhia das Letras.


Foto de João Coutinho

sexta-feira, dezembro 02, 2005

As palavras antes das palavras


Saudade - s.f. desiderium, dolor; ter saudades, desiderio teneri, desiderio flagrare, desiderio confici; ter saudades de alguém, desiderare aliquem, ex desiderio alicius laborare.

Dicionário Português-Latim/Latim-Português, Porto, Porto Editora, 2005


Foto de João Coutinho